terça-feira, 19 de março de 2019

Two Feather Fly

A simplicidade da pesca com mosca pode ser claramente observada em diversos aspectos que a envolvem. Desde o equipamento (que em algumas condições de pesca pode até ser bastante sofisticado, como as carretilhas utilizadas para a pesca de espécies marinhas, mas que ainda podem ser consideradas puramente um dispositivo para armazenar a linha), passando pela frugalidade do arremesso (cuja intenção primária é impulsionar a mosca até o peixe, através de movimentos da mão e do corpo, como propriamente escreveu o genial Mel Krieger no artigo Simplicity para a Federation of Fly Fishers), chegando até a caixa de moscas (onde exemplos como a Brassie e a Killer Bug nos lembram que moscas eficientes podem ser tão singelas quanto fios enrolados em um anzol). 


A simples e eficaz Two Feather Fly


Muitas vezes, manter as coisas simples (ainda que possa parecer paradoxal) não é uma tarefa fácil, e não raramente só os mestres conseguem essa proeza. Um dos mais consagrados e venerados mestres atadores americanos, Harry Darbee conseguiu retratar com particular veemência o conceito de simplicidade em um padrão que além de utilizar poucos materiais e exigir poucos passos para a montagem, superou um outro grande desafio: criar uma mosca extremamente leve que imitasse grandes espécies de mayflies. A Two Feather Fly foi concebida para ser atada em anzóis pequenos proporcionando a leveza necessária ao uso de tippets finos e apresentações delicadas. 

A genialidade desse padrão se deve principalmente ao fato de utilizar somente uma pena para a montagem da cauda, corpo e asas da mosca. A técnica empregada produz um corpo destacado (detached body) bastante realístico, uma cauda longa e delgada e asas no padrão Catskill, ligeiramente mais longas que as vistas nos atados mais modernos (essa mosca foi criada por volta dos anos 60). Essas asas mais longas até podem ser aparadas, particularmente as prefiro com as pontas ainda que sejam mais alongadas. 

Afora a simplicidade da construção e a modesta quantidade de materiais, há um passo muito importante nessa montagem (poderia-se dizer até que seria um passo de pré-montagem): a cautelosa escolha da pena que formará corpo, cauda e asas. Vejamos a seguir os cuidados necessários para a seleção adequada da pena, os outros materiais empregados e os passos da montagem. 

Material Básico:


  • Anzol Partridge Capitain Hamilton Dry Fly #16
  • Fio de atado 14/0, Cor Light Cahill, Dun ou Cinza Claro
  • Pena de Galo (Hackle) Grizzly
  • Pena de Pato (Mallard, Gadwall ou Woodduck) 



Passo a Passo:

1º Como dito antes, a correta escolha da pena é um dos pontos mais importantes para essa montagem. As fibras não devem variar muito de comprimento ao longo da pena, desde a base até a ponta. Escolhida a pena, retire a parte das plumas (fibras mais macias) expondo a raque (a parte central). 


2º Separe uma pequena quantidade de fibras da ponta (algo entre 20 e 30), segure-as com os dedos indicador e polegar da mão de atado (a mão direita para os destros) e puxe o restante das fibras no sentido oposto com a mão do material (a mão esquerda para os destros). Nesse ponto teremos 3 conjuntos de fibras, um punhado na direita, um punhado na esquerda e um punhado no meio. Desbaste o conjunto da esquerda e o da direita para que tenham aproximadamente a mesma quantidade de fibras que o punhado do meio.


3º Com o indicador e o polegar da mão de atado, segure as fibras aplicando um pouco de pressão, somente o necessário para permitir que a mão do material possa puxar a pena até que os punhados de fibras da esquerda e da direita estejam voltados para a base da pena formando o corpo da mosca. 


4º Coloque um anzol com a farpa amassada na morsa e faça uma pequena base de fio de atado iniciando a 2/3 do comprimento da haste, indo até sua metade no sentido da curva do anzol. 


5º Posicione a pena sobre a haste, com o punhado de fibras do meio voltado para a curva do anzol. Fixe a pena (e as fibras como estavam no passo 3) com duas voltas do fio de atado, impondo tensão suficiente para que a pena não saia do lugar, mas que permita puxá-la para trás (na direção da curva do anzol), até que o punhado de fibras que está pra frente e que formará as asas esteja com o tamanho adequado (aproximadamente 2,5 vezes o gap do anzol). Aplique mais três ou quatro voltas de thread com mais tensão para fixar melhor a pena. 


6º Aplique algumas voltas de fio de atado entre os punhados de fibras e a haste do anzol para dar firmeza às asas, cuidando para não fixar a raque da pena. Uma das melhores técnicas é movimentar o fio de atado com se estivesse desenhando um "X", começando pela frente do punhado de fibras, passando sobre a haste, voltando por baixo e seguindo da mesma forma pelo outro lado. 


7º Termine posicionando o fio de atado atrás das asas e corte a raque o mais rente possível da haste do anzol. 

Visão Superior

A visão frontal da mosca com as asas corretamente atadas deverá ser como na imagem abaixo.

Visão Frontal

8º Logo atrás das asas, prenda a pena de galo para formar o hackle, com a face brilhante voltada para cima. Avance com o fio de atado para a frente das asas, mais próximo ao olho do anzol. 


9º Aplique duas voltas com a pena na parte de trás das asas e mais duas a três voltas na parte da frente das asas. Arremate a amarração do hackle com algumas voltas do thread e corte o excesso da pena de galo.


10º Faça o nó de acabamento de sua preferência e aplique uma gota de cola para travar o nó. No tufo de penas do meio, separe 2 fibras de cada lado, puxando-as cuidadosamente no sentido contrário. 


11º Com a ponta da tesoura e uma boa dose de cautela, descarte o punhado de fibras que sobrou cortando a raque logo após as duas fibras separadas anteriormente para finalizar a cauda. 



Variantes:

Não há muito o que variar nesse padrão a não ser a tonalidade das penas que poderá ser natural, bronze, cinza, etc. Como havia dito acima, caso as asas tenham ficado demasiado compridas, pode-se apará-las para que tenham o tamanho ligeiramente maior que as fibras do hackle. E finalmente, na hipótese dos peixes estarem refugando, a parte de baixo do hackle pode ser aparada.


As asas e cauda longas e o corpo destacado retratam uma grande mayfly 
em um anzol relativamente pequeno dado o tamanho da mosca

Visão frontal mostrando as asas, o hackle e a cauda bifurcada



Como trabalhar a isca:

A técnica aplicada para esse padrão é a mesma para qualquer mosca seca, deve-se arremessar a mosca rio acima e deixá-la derivar da forma mais natural possível correnteza abaixo. Particularmente em águas calmas e lagos, pode-se lançar mão do twitching, fazendo levantamentos curtos da ponta da vara que farão a mosca dar breves avanços na superfície, e do skating aplicando-se pequenos toques, fazendo a mosca deslizar na superfície da água como se fosse um inseto pulando ou tentando voltar a voar.


Grande Abraço